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A Unidade de Fertilizantes Nitrogenados III (UFN-III), em Três Lagoas (MS), é um dos empreendimentos mais emblemáticos da indústria brasileira recente. Concebida em 2011 como pilar estratégico para a soberania alimentar e redução da dependência de fertilizantes importados, a obra foi paralisada em dezembro de 2014 com 81% de execução. Desde então, o projeto atravessou falência de consórcio, escândalos da Lava Jato, tentativas frustradas de venda e anos de abandono.
Por Henrique Ferian
Agora, sob nova política da Petrobras e do governo federal, a retomada está em curso, com investimentos estimados em R$ 3,5 bilhões e previsão de operação em 2028.
A construção da UFN-III começou em setembro de 2011. O projeto previa a produção de 3.600 toneladas de ureia e 2.200 toneladas de amônia por dia, suprindo até 15% da demanda nacional por nitrogenados.
A localização em Três Lagoas foi estratégica: proximidade com o agronegócio e acesso ao gasoduto Bolívia-Brasil, essencial para o fornecimento de gás natural.
Mas, em 2014, vieram os primeiros sinais de crise. O consórcio responsável, formado pela Sinopec e Galvão Engenharia, acumulava dívidas com fornecedores e atrasos. Em dezembro, a Petrobras rescindiu o contrato, deixando para trás uma obra quase concluída e já com mais de R$ 3 bilhões investidos.
A paralisação deixou um rastro de dívidas que, à época, variavam de R$ 30 milhões a R$ 64 milhões com fornecedores locais — valores que, atualizados, beiram R$ 150 milhões. Empresários relatam que foi “a maior frustração da história de Três Lagoas”, levando empresas à falência e um trauma econômico que perdura.
Paralelamente, a Operação Lava Jato investigava irregularidades envolvendo a Galvão Engenharia e contratos da Petrobras. O escândalo afetou a credibilidade da estatal, rebaixada por agências de risco e sem capacidade de investir em grandes empreendimentos.
Na estratégia de desinvestimento da Petrobras, a UFN-III foi colocada à venda em 2017. O grupo russo Acron foi o único interessado e chegou a assinar propostas de compra, anunciadas inclusive pelo governo federal em 2022.
Mas o negócio não prosperou. A Acron queria instalar apenas uma misturadora de fertilizantes, de menor valor agregado, em desacordo com o projeto original e com os incentivos fiscais do governo estadual. Além disso, a dependência do gás boliviano e a instabilidade política no país vizinho fragilizaram o acordo. A guerra na Ucrânia e as sanções contra empresas russas sepultaram de vez a transação.
Com a mudança de governo em 2023, a Petrobras reviu sua estratégia e incluiu a UFN-III no Plano Estratégico 2024-2028+. A estatal abandonou a política de desinvestimentos e decidiu retomar o projeto como ativo estratégico, em sintonia com a política de reindustrialização do país.
Visitas técnicas de autoridades federais e estaduais reforçaram o compromisso político. Editais foram lançados para avaliação técnica da planta e preservação dos equipamentos, muitos deles expostos por quase uma década.
A expectativa é que a licitação para reinício das obras seja concluída até o fim de 2024, com execução em até dois anos e operação plena em 2028.
A UFN-III promete transformar novamente a economia de Três Lagoas:
A trajetória da UFN-III é um retrato da complexidade dos megaprojetos no Brasil. Do otimismo inicial ao trauma econômico local, passando por corrupção, falências e negociações frustradas, o caso revela falhas de governança e riscos políticos que marcaram uma década de estagnação.
Agora, com a retomada, a fábrica pode finalmente cumprir o papel estratégico para o qual foi concebida: garantir autonomia em fertilizantes e impulsionar o desenvolvimento de Três Lagoas e do Brasil. O desafio será transformar a promessa em realidade, corrigindo os erros do passado e entregando um legado de soberania industrial e prosperidade regional.